terça-feira, 29 de novembro de 2011

As favas da crise


É um dado adquirido que vamos ser nós – vocês sabem de quem eu estou a falar – a pagar as favas. Nem, aliás, outra coisa seria de esperar. As bestas que passaram pelo poder, tal como as alimárias que lá estão agora, leram todas a mesma cartilha e, mesmo que esteja demonstrado até à exaustão que este caminho não tem saída, insistem em marrar contra a parede.
Mas, voltando às favas, farei tudo o que puder para não as pagar. Nem que tenha de as semear. O que, pela primeira vez na minha vida, acabei de fazer no meu quintal. Só mesmo para ser do contra. É por isso que aqui vai, pelo menos é o que espero, nascer um pequeno faval. Ínfimo, por assim dizer, mas que, simbolicamente, representa o meu protesto. Se o tempo permitir, num outro local, tratarei de “protestar” muito mais. Tanto que – caso a colheita corresponda às expectativas – favas será coisa que não pagarei. Mas disso darei conta na ocasião.

domingo, 27 de novembro de 2011

Coisas da lavoura


Ao contrário do que a imagem pode sugerir, não se trata de uma plantação de garrafões. É, apenas, a forma que encontrei de preservar as ervilhas, que começam agora a despontar, da gula dos pardais. Espantalhos e outras artimanhas têm-se revelado incapazes de atemorizar os pequenos terroristas alados que insistem em saciar o seu apetite voraz no meu diminuto quintal. A técnica consiste em cortar ao meio um garrafão de agua, fazer-lhe diversos furos para permitir a circulação do ar e colocar sobre as plantas recém-nascidas. Quando começam a surgir as primeiras flores retira-se a protecção porque, nessa altura, a passarada já não representa qualquer perigo para as plantas.
Mesmo com todos estes cuidados a produção não será por aí além. Nem terá grande peso na redução da minha dependência alimentar face ao exterior. É antes, digamos, uma forma de me ir habituando a empobrecer com alguma qualidade. E, também, de contribuir, ainda que de forma modesta, para o empobrecimento de outros. Pela primeira vez nos últimos dez ou quinze anos, o meu quintal vai ser integralmente aproveitado para cultivar alguns produtos hortícolas, e, assim, para além de obter produtos mais saudáveis, poupar uns trocos. Poucos, obviamente, mas que a juntar a muitos outros, constituem a minha humilde contribuição para atingir o novo desígnio nacional. Empobrecer. Empobreçamos, então.

sábado, 26 de novembro de 2011

Eles não regulam bem...


Hoje no tradicional mercado dos Sábados, em Estremoz - entre galinhas e outros galináceos, couves e restantes vegetais, brinhol e outras iguarias ou velharias e umas quantas modernices – vendiam-se, também, cartões de crédito. Ignoro se as vendas tiveram êxito, se revelaram um fracasso ou terão corrido dentro daquilo que eram as expectativas de quem vende. No entanto, ainda que para os vendedores – coitados, precisam de se governar como toda a gente – a manhã tenha corrido bem, não auguro nada de especialmente bom para os eventuais compradores.
Atendendo à prática comercial particularmente agressiva – chata, até – dos promotores destes produtos, não me parece adequado permitir a sua actuação em plena via pública. Nem toda a gente consegue contrariar a sua insistência e – às vezes é necessário – olhá-los nos olhos e dizer-lhes que não queremos ser incomodados. É que não vale a pena lamentar que as pessoas passem dificuldades por causa desses malandros dos bancos e, simultaneamente, permitir que eles andem por aí a semear crédito fácil. Um pouco de regulação, neste caso, era capaz de não fazer mal a ninguém.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Oportunidades. Ou oportunistas, sei lá.


Isto da crise tem um lado bom. Ou, se calhar, até mais do que um. Faz, por exemplo, despertar o empreendedor que existe escondido em cada cidadão e estimula ainda mais o espírito de iniciativa dos que têm mais olho para o negócio. Até mesmo em Estremoz e no Alentejo em geral, onde tradicionalmente por factores da mais variada ordem que agora não vêm ao caso existe uma menor capacidade de iniciativa, já vão surgindo pessoas a investir em pequenos negócios – esquemas, vá – capazes de proporcionar uma rentabilidade bastante interessante.
Foi o caso com que me deparei na última edição de um jornal local – o Brados do Alentejo – onde um anúncio, também colocado em diversos sites na Internet, se propõe ensinar “como ganhar dinheiro trabalhando em casa”. Muito dinheiro. Para mais de “dois mil e quinhentos euros mensais”. Melhor ainda, de uma maneira “fácil e agradável”. Provavelmente tratar-se-à daquele fantástico negócio de dobrar circulares e introduzi-las em envelopes. Coisa para dar uns cobres ao anunciante – investidor, digamos – caso muitos parvos caiam na esparrela.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Greve quase geral

Apesar de sobejarem motivos de indignação perante o actual estado de coisas, não vou fazer greve amanhã. Não estou disponível para contribuir com um dia de ordenado para o governo - o que, admito, levará o ministro das finanças a desejar uma significativa adesão da parte da função pública – nem sou, como já escrevi por aqui variadíssimas vezes, especial apreciador desta forma de luta. Prefiro o boicote, a sabotagem e outras maneiras mais astutas – mais sacanas, vá - de contrariar as intenções do governo e que não envolvam a diminuição do meu pecúlio em favor do Estado, mas exactamente o contrário.
Embora isso não me cause especial incomodo, desconfio que entre os grevistas de amanhã estarão muitos com responsabilidade – que nisto, como noutras coisas, não há inocentes – por termos chegado até aqui. Nomeadamente aqueles sindicalistas que, há dezenas de anos, contribuíram para abarrotar os quadros da função pública. É verdade que hoje faz-se o mesmo sem ouvir os sindicatos, mas isso não branqueia a verdadeira mancha vermelha que, por exemplo, alastrou por quase todas as Câmaras do Alentejo.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

A estranha aranha



O meu quintal parece exercer um fascínio irresistível sobre a bicharada. Desde um pato-bravo, o saboroso Barnabé, que o escolheu para se despenhar, até ao gato maricas da vizinha. Sem esquecer um coelho que se conseguiu escapulir de uma forma muito mais espectacular do que qualquer Michael Scofield. Isto para referir apenas os maiores, porque, com dimensões bastante mais reduzidas, são inúmeras as formas de vida que escolhem este pequeno pedaço de terreno para passar parte das suas curtas vidas.
Desta vez foi esta coisa esquisita. Uma aranha, ao que aparenta. Diferente de todas as outras que tinha visto antes e que, pela pesquisa de imagens que fiz na net, não parece muito popular. Nem mesmo para aracnídeo. Pelo menos a julgar pela falta de fotografias de outras da sua espécie. Tinha, sensivelmente, o tamanho de uma moeda de um euro e, quando esmagada derramou uma substância viscosa e amarelada. De salientar que, até agora, ninguém reclamou o corpo nem a família apareceu para o funeral.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Jardim iluminado

As luzinhas da Madeira, aquelas que vão alumiar a vaidade de Alberto João, estarão prestes a acender. Diz que é próprio do natal e que sem elas a época não terá tanta piada. Estará, portanto, desculpado aos olhos de muitos que acharão esta despesa das menos más quando comparadas com outras que o mesmo personagem tem protagonizado. Não partilho, obviamente, desta opinião. Os enfeites natalícios de ruas, praças e largos – pelo menos com a exuberância e ostentação que se conhecem – são relativamente recentes, servindo essencialmente para alimentar os egos – quando não outras coisas – dos seus mentores. Á custa, como é fácil de calcular, dos bolsos de todos. E, por mais que me tentem convencer do contrário, em pouco contribuem para a dinamização seja do que for. A menos, talvez, da carteira do gajo que vende as lâmpadas.
No actual contexto uma iniciativa deste género mais parece uma provocação. Queimar largos milhões de euros e não pagar as dividas, não direi que seja inédito. É, no entanto, uma irresponsabilidade própria de um nababo que há muito tempo devia ter sido afastado da proximidade de qualquer local onde exista dinheiro público. Também por isto sinto-me cada vez mais satisfeito por não ter colaborado nem com um cêntimo para a campanha de angariação de donativos organizada na sequência do temporal na Madeira. Verifico agora que o meu contributo não era necessário. Afinal dinheiro é coisa que não falta por lá.

domingo, 20 de novembro de 2011

Assalto facturado


Tudo serve de pretexto para nos irem ao bolso. Vejam-se, por exemplo, as facturas da água ou da electricidade. São tantas as parcelas facturadas, a suportar pelo consumidor, que chega a ser difícil perceber o que efectivamente gastámos em água ou luz e quanto do que nos é facturado vai para aquilo a que, eufemisticamente, chamam de taxas, impostos e outros contos do vigário.
Mas parece que, ainda assim, não chega. É preciso mais. Cada vez mais. Novas taxas, tarifas, impostos, sobre-taxas e tudo o que a fértil imaginação da gentalha que manda destas coisas conseguir inventar irão, num futuro não muito longínquo, juntar-se ao extenso rol do que todos os meses temos de pagar. Deve ser a isso que chamam sacrifícios. Só falta dizerem que lhes dói mais a eles do que a nós...

sábado, 19 de novembro de 2011

Roubalheira!

Pagar é algo que me desagrada. Quando se trata de impostos, então, nem se fala. Nomeadamente quando daí não se retira qualquer lógica para além da mais descarada roubalheira. É o caso dos cinco euros que este mês me estão a ser cobrados a titulo de imposto de selo pela utilização do cartão de crédito. Mais uma invenção dos criativos das finanças – no caso os outros que lá estiveram e dos quais estes que lá estão agora em nada diferem – encontraram para nos sacar dinheiro. Os espertalhões arranjaram um esquema manhoso em que – pasmai – mesmo não tendo qualquer valor em divida e esteja a decorrer o prazo para o pagamento do extracto mensal, o portador do cartão de crédito é sempre obrigado a pagar uma percentagem sobre o valor das compras. Ainda que pague a totalidade dentro do prazo estabelecido.
Por alguma razão, que segunda-feira vou tratar de averiguar, apesar da legislação já ter mais de um ano, este foi o primeiro mês que o banco de que sou cliente se aproveitou da marosca. O roubo está legitimado por esta jóia da arte de sacar dinheiro: “Crédito utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outra forma em que o prazo de utilização não seja determinado ou determinável, sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30”. Portanto crédito gratuito por cinquenta dias foi coisa que passou à história. Tal como o meu cartão de crédito. Logo que pague o extracto deste mês vou entregá-lo ao banco. Não estou para engordar gulosos.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Despesa, querem eles dizer...


Num prospecto hoje distribuído à porta do meu local de trabalho, onde se apela à mobilização para a próxima greve geral, consta, entre outras, uma proposta “não só exequível como absolutamente indispensável” com contornos assaz curiosos. Propõem os autores do manifesto “a aposta no investimento produtivo e no investimento público”. Ora, a menos que esteja a ver mal a coisa, é precisamente por aqui reside o problema. Como se depreende da construção da frase assume-se desde logo que o investimento público não é produtivo. E, de facto, não tem sido. Estádios onde ninguém joga à bola, auto estradas onde não passam automóveis, estradas que vão de nenhures a sítio nenhum e escolas novas onde não existem crianças, podem constar de um extenso rol de investimentos públicos, manifestamente improdutivos, que contribuíram decisivamente para o estado a que chegámos.
Existirão motivos de sobra para apelar à greve. Entre os quais se incluirão a exigência na aposta em investimento produtivo, seja ele público ou privado. Ou, também, para exigir a responsabilização daqueles que, nesta matéria, insistiram em tomar opções que, como saltava à vista de qualquer iletrado, acabaram por se confirmar ruinosas. E, já agora, porque não igualmente daqueles que, de uma ou de outra forma, andam por aí a exigir, para além de investimento produtivo, também investimento público?!

Mas que raio andam estes economistas a fumar?!

“Os cortes salariais no sector privado poderiam pôr em causa a solidez do sistema financeiro nacional por causa do grande endividamento das famílias. Assim, cortar os rendimentos punha em causa não só a situação social como o sector financeiro, já que muitas famílias poderiam ficar sem conseguir pagar os seus empréstimos aos bancos”. 
Foi o que teve o descaramento de zurrar um reputado economista. Curiosa interpretação, esta. Principalmente quando vinda de quem não manifestou idêntica preocupação quando foi anunciada a mesma receita para os trabalhadores da função pública. Talvez o cavalheiro considere que os últimos não têm empréstimos a pagar ou – hipótese a não descartar mas que eu não partilho - são mais honestos que os trabalhadores dos privados. Um pândego, o homem.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Tadinhos...

Decididamente não compreendo os portugueses. Pelo menos aqueles que não se importam de dar a conhecer as suas opiniões. Até há poucas horas os cortes que atingem os funcionários públicos eram considerados como algo de bom. Após a troika revelar o seu entendimento que iguais cortes deviam também abranger os trabalhadores do sector privado, o sentido das opiniões que se podem encontrar em blogues e nas caixas de comentários dos jornais, vão em sentido diametralmente oposto. O que antes era bom - só atingia os malandros da função pública - é agora mau porque, mais cedo do que tarde se vai aplicar a todos. Impressionante a coerência de certa gentinha.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

A sesta

Não foi à ora tanto tempo que um grupo de alarves andou a tentar motivar os portugueses para a importância da sesta e, pasme-se, chegou a tentar que a pausa para passar pelas brasas fosse consignada como um direito. Entretanto o mundo mudou. A vida tal como a conhecíamos acabou e agora até em Espanha o intervalo para dormir está a ser colocado em causa. Tudo indica que mesmo em Espanha esta tradição nacional tenha, pelo menos para quem trabalha, os dias contados.
Nunca, nem em pequeno, fui adepto da sesta. Nessa altura nem obrigado pregava olho. Sempre achei um absurdo a ideia de interromper o trabalho, ou prolongar a hora de almoço, para tirar uma soneca. Desconfio, no entanto, que entre quem defendia antes o direito à sesta se devem encontrar muitos que agora defendem o contrário. Em nome da produtividade. Ou de algo assim.