A comunicação social, a blogosfera, a classe política e uma pequena parte do país real discutiram não há assim tanto tempo, de forma acalorada, se em Portugal havia ou não condicionalismos que limitavam a liberdade de expressão. Fui um dos subscritores da petição on-line que sobre esta matéria circulou pela internet mas, provavelmente, por razões diferentes da maioria dos que subscreveram o tal abaixo-assinado virtual. Pese todas as tentativas de controlo da comunicação social por parte do poder político, ou das ameaças e chantagens dos seus apaniguados para controlar a bloga, não me parece que a liberdade de cada um exprimir as suas opiniões políticas esteja em causa. Afirmar o contrário é, para não lhe chamar outra coisa, patético.
Como venho a afirmar há muito tempo a liberdade de expressão está, de facto, ameaçada mas por outros motivos. Que – e aí reside, quanto a mim, o verdadeiro perigo – vão muito para além das opções politicas de cada cidadão. Vivemos a época do politicamente correcto, onde uma elite supostamente bem pensante define os termos e as condições em que nos devemos pronunciar acerca das coisas mais banais. O pior é que nem sempre damos conta dos seus avanços, dos tentáculos com que vão silenciando a sociedade e da forma, como quase sem nos apercebermos, vamos expulsando da nossa linguagem palavras ou expressões que sempre utilizámos.
Como todas as ditaduras também esta é ridícula. Veja-se um recente episódio em que um ouvinte da rádio pública se queixou ao provedor do ouvinte da dita estação por o jornalista que fazia a transmissão radiofónica do jogo de futebol entre o Sporting e o Everton ter usado, durante o relato, expressões como “ graças a Deus”, “Deus queira” ou “oxalá”. Argumenta a criatura que “a utilização destas expressões é injustificável precisamente porque a linguagem na comunicação social laica deve ser a adequada”, entre outros argumentos, verdadeiramente risíveis, que evoca para sustentar a sua critica relativamente ao trabalho do profissional que assegurou a cobertura do evento desportivo em causa.
Se a existência deste tipo de queixa já de si seria motivo para preocupação – pelo menos pela sanidade mental de quem a faz – a coisa piora quando o provedor lhe dá razão. Vai mesmo mais longe e afirma que “não fazem sentido expressões destas numa transmissão radiofónica” e que “a melhor forma de as evitar é o exercício de uma atenção crítica e autocrítica permanentes na área profissional”. Um pouco de auto censura, portanto.
Se episódios destes não são condicionadores da liberdade de expressão, então não sei como os classifique. Até porque se repetem com uma frequência inusitada em todos os sectores da sociedade. Mesmo na classe politica, que também é vitima desta nova e repugnante classe de ditadores. Ou ainda ninguém reparou como o termo “autista”, outrora tão em voga independentemente do evidente mau gosto, desapareceu misteriosamente do debate político?