quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

As favas da crise II (ou três, sei lá!)


Alhos, ervilhas, poejos, coentros, salsa, nabiças, espinafres, favas e a meia dúzia de árvores que vão fazendo por sobreviver no meu quintal, começam a desesperar por uma boa chuvada. A reserva estratégica que armazenei chegou ao fim com o esvaziamento do último recipiente, a água da rede está pela hora da morte e no céu nem uma nuvenzita que prometa chuva. Daí que comece a pensar que escolhi mal a altura para me dedicar a cuidar da terra.
Apesar da seca e do racionamento de água a que têm estado submetidas, as favas da crise ainda apresentam um desenvolvimento bastante aceitável. Mas, a menos que a fezada da ministra da agricultura se concretize, o futuro não augura nada de bom também para estas plantas. O que seria uma pena. É que não gosto - nunca comi - mas tenho andado a preparar-me psicologicamente para a minha primeira refeição envolvendo favas.  

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Compreendi-te...


Se um tal Paul Krugman acha que os salários em Portugal devem ser reduzidos em, pelo menos, trinta por cento, não serei eu – humilde ignorante que, tal como Jesus Cristo, não tenho biblioteca nem estudei economia – a ter a ousadia de pensar o contrário. Nem, menos ainda, de considerar isso uma parvoíce. Isto apesar de ter uma pequena dificuldade em perceber – embora, de certeza absoluta, isso seja culpa da minha manifesta ignorância – que o dito senhor, reconhecido génio desta ciência, defenda em simultâneo a quebra dos ordenados e que não devem ser aplicadas mais medidas de austeridade. Isso, adianta, seria mau. Muito mau.
Ora eu que, reafirmo, não percebo nada disto, andava convencido que a minha vida se tinha tornado mais austera desde que me começaram a cortar no ordenado. Estava, pelos vistos, enganado. Embora, vá lá saber-se porquê, quando ouvi o discurso do homem tenha ficado com a sensação que ele teria querido dizer o mesmo que eu digo sempre que a conversa não me agrada: Estou inteiramente de acordo e simultaneamente de opinião contrária.

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Não é liquido que a banca tenha falta de liquidez.


Está criada a ideia que entre os principais problemas do país estão o excesso de endividamento dos particulares e a falta de liquidez da banca. O que, no segundo caso, estará a impedir o acesso das empresas ao crédito bancário e, por consequência, a causar sérios problemas ao crescimento da economia.
Tenho, cada vez mais, sérias reservas quanto à credibilidade desta tese. É que, ciclicamente, a caixa de correio é invadida por propaganda como a que a imagem documenta. Acompanhada, esclareça-se, de um monte de documentação, aparentemente válida, que inclui um contrato de crédito pessoal já devidamente assinado e que bastará devolver pelo correio para ter acesso a uma simpática quantia que poderei esturrar como muito bem me apetecer.
Não parece, portanto, que exista falta de liquidez à banca nacional. Tal como não se afigura que se verifique algum problema com o endividamento dos particulares. Se assim fosse este dinheiro estaria reservado para financiar projectos inovadores de um qualquer dinâmico empreendedor e jamais ao dispor de um gajo como eu, com manifesta tendência para viver acima das minhas possibilidades, com pouca vontade de trabalhar e a mania de fazer vida de rico à custa do dinheiro dos esforçados e produtivos trabalhadores alemães.
Num momento de rara sagacidade e de um invulgar sentido patriótico, decidi não usufruir de tão tentadora oferta. Fica para a próxima. Por agora a papelada vai ficar arquivada. Se a crise apertar talvez ainda venha a servir para limpar o cu.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Profissão errada


Há quem diga que o mundo está nesta tragédia porque as pessoas que o deviam governar não têm tempo. Estão demasiado ocupadas a cortar cabelo e a conduzir táxis. Ou, acrescento eu com alguma imodéstia, a escrever em blogues. Mas o contrário não será menos verdade. Muitos dos que estão em funções governativas desempenhariam muitíssimo melhor outras actividades. Fazer-nos rir, por exemplo. Quem se lembraria de juntar mais de duzentas pessoas para, durante horas discutir as vantagens da água engarrafada versus aguinha del cano?! Ou a quem ocorreria a fantástica ideia de inventar uma nova profissão de gestor de carreira para desempregados?! Daí acreditar convictamente que o mundo seria um lugar bem melhor se as pessoas que nos podiam divertir não estivessem demasiado ocupadas a governar.  

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

O fim anunciado do Estado caloteiro


Foi publicada na terça-feira de carnaval a chamada lei dos compromissos. Pretende-se, no âmbito do acordado com a troika, ver drasticamente reduzidos os prazo de pagamento dos valores em divida das administrações públicas e fazer com que estas cumpram as suas obrigações no prazo de noventa dias. Parece, portanto, um objectivo nobre. Atingi-lo é que vai ser uma chatice. Principalmente porque o caminho escolhido é sinuoso e as regras impostas vão contra os mais elementares princípios de governação. Pelo menos daquela a que estamos habituados. E sem a qual, por mais que digamos o contrário, não concebemos a função de governar.
Comprar apenas quando temos uma razoável certeza de, a curto prazo, ter dinheiro, não é algo a que estejamos habituados. Seja na vida privada ou, ainda muitíssimo menos, na pública. Será, acredito, um choque. Até porque quase ninguém está preparado – ou tem, sequer, conhecimento – do que aí vem e das consequências que, a todos os níveis se vão fazer sentir no dia-a-dia de cada cidadão. E nem sequer estou a pensar nas obras que as Câmaras vão deixar de fazer ou dos ordenados que – no limite - muitos organismos públicos terão dificuldade em satisfazer. Preocupa-me antes que um qualquer hospital, onde tenha o azar de ir parar, não possua fundos disponíveis para adquirir a anestesia necessária para realizar cirurgias e desate a operar a sangue-frio.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Carnaval cá do sitio




Outros, com muito mais conhecimento de causa do que eu, farão o balanço do carnaval cá da terrinha. Por mim foi igual aos anteriores. Se isso o inclui no grupo dos bons ou, pelo contrário, o integra no conjunto dos que não valem um chavelho, é coisa que me interessa pouco. Para já manifestações de desagrado, pelo menos visíveis, apenas a do cachorro da foto, que não se coibiu de demonstrar a sua irritação com os cabeçudos.
De realçar – do meu ponto de vista, claro – o facto de finalmente ter existido um arremedo de sátira e de terem desfilado umas gajas relativamente despidas. Nada de muito animador, mas - quem sabe – possa constituir um incentivo a que outras folionas, em próximas edições, sigam o exemplo e nos proporcionem imagens muito mais interessantes.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

A couve da crise


Pela primeira vez em muito anos praticamente toda a área cultivável do meu quintal foi aproveitada para semear - ou plantar, conforme o caso – diversos produtos hortícolas. Por todo o lado, até mesmo nos locais mais improváveis, há vegetais que mais tarde ou mais cedo vão acabar na panela. Como, por exemplo, neste vaso. Mas – verdade, verdadinha – é que o crescimento desta couve escanzelada foi obra do acaso. Uma verdadeira couve da crise, portanto.

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Teóricos do trabalho


Alguns, de repente e assim quase do nada, descobriram as virtudes do trabalho. Nomeadamente aquelas que envolvem a alegada necessidade de trabalhar mais horas, de acabar com feriados, suprimir pontes, gozar menos dias de férias ou até, pasme-se, voltar a fazer do Sábado um dia normal de labuta. Porque, dizem, tem sido o incumprimento destes preceitos que nos conduziu até aqui e apenas trabalhando muito mais – tempo, entenda-se – sairemos da crise.
Noto inúmeras incoerências neste discurso. Principalmente quando, em simultâneo, se enaltece ou alude como necessário o “investimento” nesta ou naquela obra megalómana que lhes agrada particularmente. Mesmo que daí, passado o período de construção e muitos milhões depois, não resulte a criação de qualquer posto de trabalho. Pelo menos daqueles úteis e produtivos. Parece-lhes importar muito pouco que os mamarrachos – os tais “investimentos”, segundo eles - apenas pelo facto de existirem tenham custos significativos. Se calhar até mais pesados para o país do que umas quantas tolerâncias de ponto. São, aliás, conhecidos exemplos em que a demolição já chegou a ser ponderada como solução mais razoável.
Apesar de todo o historial de má aplicação dos recursos públicos, próprios ou vindos da Europa, insistem neste argumento patético. O rigor, quando se trata de gerir a coisa pública, apenas se lhes afigura importante quando em causa estão os direitos mais básicos das pessoas. Se for para construir edifícios onde poucos entram, estradas onde ninguém passa, infra-estruturas sem utilidade, distribuir benesses variadas por amigos ou compinchas ou empregar militantes do partido circunstancialmente no poder, então isso já é matéria pouco relevante e atirar para o populismo.
Mas, voltando à vaca fria – que é como diz a alegada necessidade de trabalhar mais e, por consequência, ter menos dias de lazer – tenho sérias dúvidas quanto ao real impacto na economia. Dividir o PIB pelo número de dias de trabalho e acreditar que por cada dia trabalhado a mais o seu valor aumentará na mesma proporção é, digamos, parvo. Faz-me lembrar aquele matemático que teorizava acerca da possibilidade de dividir sempre qualquer número por dois. Teoricamente um carro nunca embateria num muro ou noutro objecto fixo, porque estando, por exemplo, a um metro ainda faltariam cinquenta centímetros para lá chegar. E assim sucessivamente até ao infinito. Diz que morreu de acidente de viação. Bateu contra uma parede.