sexta-feira, 16 de abril de 2010

Calinadas

O português é uma língua muito traiçoeira. Disso já sabíamos. Também não nos é desconhecido que é muito maltratada. Mesmo ao mais alto nível. Veja-se, literalmente porque ouvir não se ouve nada, a resposta do primeiro-ministro ao chato do Anacleto Louçã. “Manso é a tua tia, pá!” constitui um enorme pontapé na gramática, como qualquer puto ranhoso do quarto ano do ensino básico tem obrigação de saber e todos os que – ranhosos ou não – se sentam no parlamento tem igualmente o dever de conhecer. 
Garanto que se no meu tempo de instrução primária mandasse uma atoarda desse calibre seria valentemente sovado. Embora nessa altura, justiça seja feita, nem fosse necessário nenhum motivo em especial para a facínora que me leccionou as primeiras letras malhar qualquer um. O facto de frequentar a sua escola já era razão suficiente. 
O pretenso insulto proferido por Sócrates enferma, portanto, de um erro fundamental. “Manso é o teu tio, pá!” estaria, isso sim, correcto. No entanto, vá lá saber-se porquê, não teria o mesmo impacto nem atingiria com a mesma intensidade aquele que se pretende ofender. Sabe-se que constitui uma ofensa muito maior a referência aos membros femininos da família. Coisa que, agora que penso nisso, se revela um intrigante mistério. Neste contexto, e partindo do principio óbvio que o adjectivo “manso” seria sempre de incluir na ofensa, o primeiro-ministro devia ter afirmado “Manso é o teu pai, pá!”. A construção da frase estaria correcta, evitando uma confrangedora calinada ao nível de outras construções pelas quais também é responsável, e, simultaneamente, ofendia Anacleto Louçã fazendo uma implícita referência a um elemento feminino da família daquele. A menos que a lembrança dos cornichos do seu ex-ministro Manuel Pinho tenham feito José Sócrates, no último momento, trocar o parentesco…

2 comentários:

  1. Calinadas é o que não falta por aí...
    Em todos os sectores e em todas as classes sociais.
    Antes passava mais despercebido, porque o 'povo' era mais ignorante e achava as palavras raras bonitas, agora o 'povo' anda qualquer coisa mais letrado, já se apercebe.
    Nos directos dos Jornalistas é ver calidadas 'a cada pé de canto', do género "o morto está completamente morto"!, "o jogador que está no chão caiu" etc., etc..
    MFCC

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  2. Não ouvi e desconhecia por completo este "comportamento rebelde e habitual dos meninos do côro da escola pública parlamentar". Ainda bem que já não existe as regras de antigamente, mas fomos do 8 ao 80 e se voltassem as palmatórias ou "a menina dos 5 olhos", muito subiria a economia com a fabriqueta desses utensilios de madeira:))))))

    Uma vergonha e só gostaria de saber a opinião dos filhos destes exemplares de pais!!!!

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