Na crise de 2009 – aquela em que, recorde-se, gastar dinheiro dos contribuintes era bom e que fazê-lo constituía quase um imperativo patriótico – os autarcas portugueses, seguindo o exemplo do governo, esmeraram-se naquilo em que tradicionalmente melhor sabem fazer. Gastar o que têm, o que não têm e aquilo que sabem nunca irão ter.
Cheios de generosidade, de amor ao próximo e imbuídos de um espírito altruísta que costuma atormentar os políticos na proximidade dos actos eleitorais, trataram de inventar planos de apoio aos extractos sociais mais desfavorecidos, medidas de emergência para auxiliar eleitores em situação de carência, estímulos ao emprego ou incentivos a tudo e mais alguma coisa. De caminho fizeram obras, arranjaram empregos, contrataram os cantores da moda, organizaram passeatas e tudo o mais que ocorreu à sua fértil imaginação.
A crise de 2010 é, ao invés da anterior, daquelas tradicionais. Conservadoras, mesmo. Parece que nesta não se pode gastar. Terá, pelo contrário, de se cortar muita despesa. Inútil ou não. Embora a mim o conceito de despesa inútil com dinheiro público me faça uma certa confusão. Se calhar quem gasta o dinheiro de todos em coisas que não são úteis devia ser preso. Ou levar um par de estalos. Não sei, digo eu assim de repente.
O certo é que agora não basta poupar. É preciso deixar de gastar onde antes de distribuía magnanimamente. Mas isso, suspeito, é tarefa impossível para os autarcas tugas. Não conhecem essa realidade, diria que nem suspeitam que exista, e fazer um esforço para reequilibrar as depauperadas contas da esmagadora maioria das autarquias não é assunto que mereça qualquer relevância.
Nada disto me surpreende. Só me entristece que não encontre ninguém que queira apostar comigo em como o país se vai iluminar com milhões de luzinhas de natal, muita gente se vai empanturrar e embebedar nas múltiplas festas alusivas à quadra, pistas de gelo não vão faltar no centro de qualquer vilória e pai-natais barrigudos cheios de prendas, de que putos mimados desdenharão, andarão por aí numa roda-viva. Tudo com o alto patrocínio da quase falida autarquia lá da terrinha.
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