A receita parece consensual. Precisamos de trabalhar e produzir mais e melhor. Até a mim, que por norma estou contra, esta ideia se afigura como razoável. Por outro lado sucedem-se os apelos contra o desperdício alimentar, nomeadamente das refeições que sobejam em restaurantes e cantinas, tendo mesmo sido criado um movimento de cidadãos que conseguiu já mobilizar uma parte significativa da sociedade para esta causa. Tal como a anterior também me parece uma intenção capaz de reunir o consenso de todos.
Pena que não se consiga mobilizar ninguém – pelo menos sensibilizar, vá – para um outro problema bem mais grave, pelo menos na minha óptica, que tem a ver com a ausência de capacidade produtiva de bens essenciais à nossa alimentação e, consequentemente, com a necessidade de importar quase tudo o que consumimos. O que, num futuro que pode não ser muito distante, inevitavelmente nos trará problemas que, por agora, dificilmente imaginamos.
Ainda sou do tempo em que cada metro quadrado de terreno era aproveitado. Por todo o lado cresciam hortas, searas ou simplesmente se plantavam couves ou semeavam batatas. Hoje nada disso acontece. Pior. Criou-se um circuito de produção que constitui um claro desincentivo a quem pretende produzir alguma coisa.
Até como estamos na época da azeitona, atentemos neste exemplo. Um olival de pequena dimensão produzirá cerca de duas toneladas. Esclareça-se, desde já, que o proprietário tem emprego que não lhe permite ser ele a apanhar a azeitona pelo que terá de recorrer ao recrutamento de mão-de-obra. Como na região as pessoas em idade activa não abundam e as que restam estão ao serviço da autarquia ou no desemprego, a alternativa é procurar entre os ciganos ou a comunidade de leste quem esteja disponível para fazer o serviço. Se tiver a sorte de encontrar, pagará dezoito cêntimos por cada quilo recolhido. Ou seja trezentos e sessenta euros. Como não possui um tractor ou outro de meio de transporte com capacidade adequada, terá de fretar um para colocar a azeitona no lagar. Coisa para, a preço de amigo, mais uns cinquenta euros. O que totaliza quatrocentos e dez euros, portanto. Chegados ao lagar o preço proposto será de vinte cêntimos por quilo. Ou seja quatrocentos euros. O que representa para o proprietário, só nesta fase do processo, um prejuízo de dez euros.
Claro que, perante este cenário, a azeitona irá ficar na árvore, apodrecer e cair ao chão. O pequeno olival produziu matéria-prima para cerca de duzentos e cinquenta litros de azeite. No entanto, por uma estranha lógica que influencia os factores de produção, o produto final nunca chegou a existir. Se calhar, também nestes casos, a culpa é dos mercados...
Sem sombras de dúvidas! O que descreves é fruto dos sucessivos governos que por normas da porcaria da UE acabaram com a "agricultura/produção" dando subsidios e não é só por acaso que o actual presidente era 1º Ministro e de um governo do tempo "das vacas gordas" e que fizeram aos milhões a "fundo perdido"?
ResponderEliminarO que contas do olival é uma realidade, e no cooperativismo (salvo raras excepções "comem tudo" e de quem sem as cooperativas? Pois!
Felizes dos velhotes que mantêm as suas pequenas hortas e animais que alimentam os filhos que estão nas grandes cidades.
Não se há muito não vens a Lisboa e se passares pela IC19 (Sintra/LIsboa/Sintra) e outras vias circundantes verás "hortas" por todo o lado e por vezes em locais impensáveis.
Até já vi o cultivo de hortaliças em varandas e nos vasos fora das varandas:)
Uma geração de subsidios-dependentes e aves políticas em altos voos mas apenas no seu proveito próprio e agora...aguenta oh Zé Povinho.
Acredito que iremos sair da crise porque o português pode ser tudo, mas burro não é!