quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Insensibilidade e falta de bom-senso (ou de senso, apenas)


Não sei o que causa tanta indignação nas declarações proferidas por um corretor inglês - que afinal, sabe-se agora, não o era -  numa entrevista televisiva onde afirmou estar radiante com a actual crise porque, ao que garantiu, lhe está a permitir auferir elevados proveitos. Qualquer corretor dos verdadeiros, se quisesse ser sincero, diria exactamente a mesma coisa. Não é desonestidade nenhuma e, nesta como em noutras profissões em que tal é possível, ganhar muito dinheiro revela  elevada competência profissional. Pena que a esmagadora maioria diabolize o lucro e dirija a sua fúria na direcção errada.
Vejamos este pequeníssimo e quase insignificante exemplo. Numa qualquer localidade, mesmo daquelas onde a maioria dos escassos habitantes está com os pés para a cova, construiu-se uma piscina, um pavilhão desportivo onde se podem praticar todas as modalidades e mais algumas, dotou-se o campo de futebol lá do sítio de um relvado todo janota, fizeram-se estradas que vão de nenhures a lado nenhum e edificaram-se duas ou três escolas todas catitas e modernaças. Isto apesar de quase não nascerem crianças lá na terra e de idênticos equipamentos existirem já em todas as localidades vizinhas. Tudo somado é coisa para vinte milhões de euros financiados a oitenta por cento. O que, para os decisores, se afigura como um negócio fantástico. Ou soberbo, na opinião dos eleitores inebriados com tanto dinamismo. Claro que o insignificante pormenor de ainda faltarem quatro milhões é apenas um miserável detalhe, só invocado pela falta de visão estratégica de uns quantos parvos. Até porque, como é óbvio, a banca estava mesmo desejosa de financiar a parte do investimento que os fundos europeus não cobriam. Apesar de, também ela tal como o país, não ter dinheiro e, por consequência, necessitar de recorrer aos mercados.
Ora, como é suposto saber-se, estas coisas pagam-se. E quando alguma coisa se paga alguém ganha alguma coisa. E é aqui que os tais corretores, insensíveis e gananciosos, entram em acção. Embora, que se saiba, nunca tenham posto os andantes na tal terriola perdida onde já não nascem crianças. Nem precisam. O melhor é mesmo não aparecerem por lá. Nessa terra – e nas outras todas também – as pessoas não gostam de quem ganha dinheiro. Apreciam muito mais quem o gasta.

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