sábado, 21 de maio de 2011

Garnisé cantante

No rescaldo do debate de ontem entre José Sócrates e Passos Coelho, Miguel Sousa Tavares, conhecido especialista em analisar tudo e mais alguma coisa, referindo-se às despesas com a saúde, afirmava peremptoriamente que o país não tem dinheiro para levar os doentes que moram na província a consultas ou tratamentos em Lisboa. Concluiu de seguida que deviam ser os familiares, vizinhos ou amigos – esqueceu-se de mencionar os parentes afastados – a tratar do caso. Até, reforçou, pelos deveres de solidariedade que todos devemos praticar. Não sei se o fulano ainda possui um monte no Alentejo. Se assim for esta posição constituirá uma boa noticia para os vizinhos que, em caso de se sentirem enrascados, já sabem a quem recorrer numa próxima ida médico. 
É por demais óbvio que o país não terá dinheiro para tudo. Era, até, quase capaz de assegurar que não tem graveto para nada. Não pode, no entanto e ao contrário do que afirma MST, cortar na assistência médica a quem dela precisa. Seja rico ou pobre, velho ou novo, resida em Lisboa ou em Estremoz. Se, como também é compreensível, não pode existir um hospital com todas as especialidades em cada aldeia, não parece também difícil de entender que o Estado tem de assegurar os recursos necessários para levar os cidadãos até onde existem os meios para os tratar. É, aliás, o que faz com bandidos a quem os juízes aplicam penas de prisão para ser cumprida ao fim de semana. Não existindo uma cadeia em cada terra, o Estado – o mesmo que não tem dinheiro para transportar doentes – coloca um taxi à porta de casa do meliante para o levar à choça no Sábado de manhã e outro, à saída da choldra no domingo á noite, para o trazer de regresso ao aconchego do lar. 
MST não reconhece aos cidadãos que residem longe dos grandes centros urbanos os mesmos direitos que assistem aos que lá moram. Apesar de pagarmos os mesmos impostos e cumprirmos deveres iguais. Evocar falta de recursos, quando se trata de saúde, é uma argumentação tão desprezível quanto quem a usa. A solução terá de passar antes pela melhor distribuição dos meios disponíveis e pela moralização das isenções. Quer das pessoas quer dos actos médicos. Porque não lembra a ninguém – excepto a alguns tresloucados – que se façam abortos à borla, se distribuam gratuitamente produtos alternativos à droga, que se isentem de taxas todos os indivíduos de uma determinada etnia, independentemente de serem ricos ou pobres, ou que – ao que se diz e por vezes escreve - se façam intervenções cirúrgicas que apenas servem para satisfazer a vaidade do paciente ou ajudar a carreira do médico. Tudo isto enquanto – alegam - não há dinheiro para transportar alguém realmente doente.

5 comentários:

  1. Kruzes, não só se fazem abortos à borla, como as mães que optem por isso têm direito a um subsídio 3 vezes maior do que eu tive de abono pré-natal!!
    E subescrevo cada linha!!

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  2. Estou de acordo contigo mas há que esclarecer uns pontinhos na minha visão das coisas:
    - embora não goste de MST ele não disse no transporte de doentes para Lisboa, mas sim para o hospital ou centro mais próximo da localidade, não em SOS, mas por exemplo fisioterapia, mudança de pensos etc. isso sim! Porque é que a Câmara ou Junta não faz esse transporte? porque não um vizinho se vai para "as mesmas bandas" não o faz? Se tem familiares em casa com carro porque não os levam?
    Com toda a certeza que se baterem à porta do MST lá no montiiii, para levar alguém ao hospital acredito que jamais o negará.
    Quantas vezes eu levo a minha mãe? as vezes que for necessário não é?, assim como levo quem me pede, evitando a vinda de uma ambulância que poderá fazer falta noutro local! A tal solidariedade que deveria haver na sociedade "e que se não pago...é para usufruir" e os carros à porta ficam em descanso, quando muitos nem sequer têm carro e nem família!

    Abortos à borla? desculpa mas não há nenhuma mulher que o faça de ânimo leve e é preferível ser assistida com dignidade e à borla num hospital público, do que como se fazia antes em que muito do material era gamado dos hospitais e que agora baixou drasticamente! Assim como quem por lá trabalha abastece-se e abastece a familia toda e até por vezes vendem (já foram apanhados alguns).
    Enfim, uma revisão e fiscalização só faria bem...mas todos nós que formamos a sociedade civil é que somos os maiores culpados e por exemplo no que toca a isenções, alguém já te esclareceu o porquê "que se isentem de taxas todos os indivíduos de uma determinada etnia, independentemente de serem ricos ou pobres"? eu não sabia e não fazem parte das isenções que constam no site do Ministério da Saúde, portanto deve ser algo "político local", não será?

    Há de facto um abuso excessivo de "um bem adquirido do qual não abro mão que é o SNS" e se me deparo com algo que não concordo, escrevo, refilo, reclamo e até denuncio, como há dias o fiz precisamente num caso do transporte de um doente e o certo é que consegui!

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  3. Fatyly

    A questão do transporte para o centro de saúde não se coloca. Não é isso que está, nem nunca esteve, em causa. O problema surge quando alguém necessita de fazer tratamentos - ou ter consultas - em Évora ou Lisboa. Não há patrão, por mais magnânimo que seja, que esteja disposto a tolerar que um empregado falte duas ou três vezes por semana - e isto de forma recorrente - para ir com o pai ou a mãe ao médico. Pior. A generalidade dos idosos não tem os filhos por perto, residem e trabalham em Lisboa ou no estrangeiro e os vizinhos, amigos ou outros familiares são tão velhos e doentes quanto eles.

    Quanto ao aborto também acho que nenhuma mulher deve ser penalizada por isso, basta-lhe o drama de ter de passar por isso, não me parece é que deva ser feito de forma gratuita e que isso inclua ainda mais uma série de direitos como, por exemplo, os que a "Naná" menciona.

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  4. E há também alguns casos como o da senhora” x” que faltou a uma Consulta em Évora pq não tinha transporte de ambulância ou táxi pago pelo centro de saúde , e depois foi de autocarro a Évora pedir que lhe marcassem nova consulta.Irinico não??

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  5. Irónico é de facto, para podermos marcar consultas nos hospitais centrais, termos de o fazer de forma presencial, depois de todos os choques tecnológicos e dos muitos milhões gastos, mais valia que tivessem chocado com o comboio.
    Ao MST pergunto para que serve o dinheiro dos impostos?
    O esse senhor fala de barriga cheia, devia pensar, antes de manifestar todo o tipo de opiniões e o contrário delas com a mesma desenvoltura de escriba ao serviço do sistema neo liberal europeu.

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