sexta-feira, 20 de julho de 2012

A algazarra dos inocentes


Tenho lido e ouvido nos últimos tempos inúmeras opiniões sustentando que os sacrifícios para reequilibrar as contas públicas devem apenas incidir sobre os funcionários do Estado porque, segundo os iluminados que assim pensam, os trabalhadores do sector privado não terão contribuído para o seu desequilíbrio. Esta teoria parece-me, ela sim, desequilibrada. Própria de alguém perfeitamente burro ou a necessitar de urgente internamento em hospital onde tratem doenças mentais. Privado, de preferência.
Esta tese é deveras curiosa. O BPN, o défice na saúde, na educação, as PPP’s, a catástrofe das empresas públicas de transportes, o descalabro da Madeira ou o desvario autárquico, são culpa de quem trabalha para o Estado. Os outros não têm nenhuma responsabilidade na matéria. Presumo que os filhos frequentam o ensino particular, apenas se tratam em clínicas privadas e só se deslocam de táxi ou automóvel próprio. Nem sequer pisam as estradas que nos custam os olhos da cara nem, tão-pouco, usam a água da torneira. Ver os Tonys Carreiras desta vida, comer o belo do frango assado na festa patrocinada pelo autarca lá do sitio e dar voltinhas na rotunda, tudo à pala do orçamento da Câmara lá da terrinha, isso então nem pensar. É, está-se mesmo a ver, coisa reservada a quem tem o privilégio de ser funcionário público.
Nem me vou referir aos que contraíram empréstimos para construir casas de duzentos metros quadrados, com piscina, jardim e barbecue. Mesmo que nelas habitem apenas duas pessoas e um cão. Nem os que a juntar a tudo isso ainda aproveitaram o crédito para comprar três carros, mobilar a casa e ir de férias para a República Dominicana. Muitos andam agora pelo Citius. Todos inocentes, claro. Por isso faz todo o sentido que não paguem a recapitalização da banca. Os funcionários públicos que façam isso.

4 comentários:

  1. Muito bem escrito, como sempre. Abraço.
    joao de miranda m.

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  2. estamos todos enterrados até ao pescoço. já ninguém se salva.

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  3. Estou de acordo contigo, embora diga com conhecimento de causa que os funcionários públicos sempre ganharam mais que no privado e na função pública tudo era permitido, regalias + regalias ao abrigos dos artigos não sei das quantas ao invés do privado.

    Dever taxar e retirar os subsídios de Natal e Férias aos grandes e nunca a partir de quem ganha 1.100€...é um roubo, é um atentado à democracia...mas já em 1983 que tudo era funcionário público, Mário Soares e o FMI retirou o subsidio de Natal e transformou no raio que o parta.

    Quem alimenta essas festas, festarolas, futebol, concertos etc.etc? o povo...mas quem paga? todos nós, não só os funcionários públicos porque todos os portugueses sustentam um Estado.

    Em todo o lado há os bons e maus e há tanto fp que deveria ser corrido à vassourada...mas o povo gosta e o que fazer?

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  4. Concordo em absoluto. Também me debrucei sobre isto no post "Uns não podem ser mais iguais do que outros". (Cheguei aqui via Tralapraki:)

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